Seis e meia de uma manhã de verão. O despertador toca e eu ainda nem consegui dormir. Entre lençóis e cama vazia, passei a noite sentindo a falta que seu corpo quente deixou em mim. Meus braços enrolam o seu travesseiro enquanto uma lágrima escorre até chegar à ponta do nariz e morrer na fronha, que abafa meu choro, já silencioso.
Levanto relutante e me enfio embaixo do chuveiro, desejando, talvez, que a água fria me desperte dessa vontade insaciável de você. Sem sucesso, acabo me lembrando daquela noite em que você chegou sem avisar e me surpreendeu durante o banho. Você me segurou no alto, quase deixando a minha cabeça encostar no chuveiro, beijou cada parte do meu corpo enquanto a água escorria fria entre nós, aumentando a temperatura de prazer e, mesmo com a água, suávamos enquanto nossos corpos uniam nossas almas.
Coloco a roupa básica de sempre. Já não me arrumo como antes: decotes exagerados e batons fortes para chamar a sua atenção. Hoje uso o preto para tentar ficar invisível para você e saio de casa com toda essa certeza de que é melhor assim. E meus olhos logo te avistam. Tento disfarçar e me concentrar em meu trabalho, mas é difícil quando alguém como você, que me provoca calafrios e excitação, está a poucos metros dali.
Mais um dia improdutivo, para mim. Observo você se movimentar para lá e para cá com papeladas, documentos, arquivos em vídeo, câmeras e gravadores. Você trabalha enquanto o mundo gira, o mundo gira enquanto eu não consigo desviar a atenção de você, não desvio os olhos de você enquanto você nem repara em mim. Deu certo. Tentar ficar invisível para você, quero dizer. Infelizmente.
Corro até o ponto de ônibus. Acabo de perder o meu. O vento forte começa a dar sinais de uma breve e devastadora chuva de verão. Os pingos caem feito pedra em minha pele e cogito a ideia de voltar para a agência. O carro preto para diante do ponto e meu coração acelera enquanto o vidro desliza para baixo.
- Entre! Te deixo em casa.
Vinte minutos até minha porta sem trocar uma palavra no caminho. Vejo você me olhando pelo canto do olho, com aquele sorriso de lado que você tem. Minhas mãos, que antes acariciavam suas coxas enquanto você dirigia, não sabem se ficam sobre minhas pernas ou no banco, ou se apoio na janela. Olho para a rua tentando ignorar o retrovisor, que mostra bem a cor exata de seus olhos. Conto as casas pelo caminho, como quem conta carneirinhos para tentar dormir. Me perco com os números logo que o carro sobe a calçada. Está calor. Estamos queimando. Ardendo.
A pressa quase nos faz arrancar a porta, ao invés de abrir. Tropeçamos no sofá, quase caímos na mesinha de centro da sala, derrubamos a luminária de mesa no chão e esbarramos na parede enquanto os beijos fervorosos e contínuos nos deixam sem fôlego. Ali mesmo o sexo começa. Tiro a camisa sem esforço algum e você arranca minha calça social. Segundos depois você desabotoa a sua camisa e eu tiro seu cinto e abaixo o zíper da sua calça. Mais alguns segundos e todas as roupas ficam no chão.
Minhas pernas envolvem seu corpo e já posso sentir você dentro de mim. Gritos e sussurros disparados enquanto fazemos amor: dançamos os passos não ensaiados, mas perfeitamente sincronizados no ambiente escuro. E então estou olhando dentro dos teus olhos, enxergando sua alma, e você responde, também com o olhar, que enxerga a minha com a mesma facilidade.
E então já não estou mais em lençóis avulsos na cama vazia. Seu corpo quente me faz companhia por toda a noite e, por três vezes, enquanto seus braços me enrolam, você diz com todas as letras: eu amo você! - o dia amanhece e seu telefone toca.
- Oi, linda... Sim, trabalhei até agora... pois é, eu tinha que entregar pro cliente agora pela manhã... ah, claro, amor!... Pode deixar!... Certo... chego em quinze minutos. Beijos.
Você procura na cômoda a aliança dourada que tirou horas antes. Coloca na mão esquerda. Continuo sentada na cama, agora vazia, enquanto você reúne suas roupas pelo chão.
- Eu amo você! – repete.
- E você a ama, também...!
- Sim, eu a amo, também.
- Por favor, tranque a porta, ao sair!
Meus pedaços ficam aqui mesmo, no chão do quarto, enquanto vejo você partir pela milésima vez.